segunda-feira, 29 de junho de 2009

VALE À PENA REFLETIR.

O filão religioso
Ricardo Gondim

As Casas Bahia disputam o mesmo mercado que a Magazine Luiza. As duas
lojas se engalfinham para abocanhar o filão dos eletrodomésticos,
guarda-roupas de madeira aglomerada e camas de esponja fina. Buscam
conquistar assalariados, serralheiros, aposentados e garis. Em seus
comercias, o preço da geladeira aparece em caracteres pequenos,
enquanto o valor da prestação explode gigante na tela da televisão. A
patuléia calcula. Não importa o número de meses, se couber no
orçamento, uma das duas, Bahia ou Luiza, fecha o negócio - o juro
embutido deve ser um dos maiores do mundo.
Toda noite, entre oito e dez horas, a mesma lengalenga se repete nos
programas evangélicos. Pelo menos quatro "ministérios" concorrem em
outro mercado: o religioso. Todos caçam clientes que sustentem, em
ordem de prioridade, os empreendimentos expansionistas, as ilusões
messiânicas e o estilo de vida nababesco dos líderes. Assim, cada
programa oferece milagres e todos calçam suas promessas com
testemunhos de gente que jura ter sido brindada pelo divino. Deus lhes
teria abençoado com uma vida sem sufoco. Infelizmente, o preço do
produto religioso nunca é explicitado. Alardeia-se apenas a
espetacular maravilha.
Considerando que a rádio também divulga prodígios a granel, como um
cliente religioso pode optar? Para preferir uma igreja, precisa
distinguir sobre qual missionário, apóstolo, pastor ou evangelista,
Deus apontou o dedo. E se tiver uma filha com leucemia aguda, não pode
errar. Ao apelar para uma igreja com pouco poder, perde a filha.

O correto seria freqüentar todas. Mas como? Em nenhuma dessas igrejas
televisivas o milagre é gratuito ou instantâneo. As letrinhas, que não
aparecem na parte de baixo do vídeo, afirmariam que, por mais "ungido"
que for o missionário, um monte de exigência vem embutida na promessa
da bênção. É preciso ser constante nos cultos por várias semanas,
contribuir financeiramente para que a obra de Deus continue e, ainda,
manter-se corretíssimo. Um deslize mínimo impede o Todo Poderoso de
operar; qualquer dúvida é considerada uma falta de fé, que mata a
possibilidade do milagre.
Lojas de eletrodoméstico vendem eletrodoméstico, óbvio. Igrejas
evangélicas comercializam a idéia de que agenciam o favor divino com
exclusividade. E por esse serviço, cobram caro, muito caro. Afinal de
contas, um produto celestial não pode ser considerado de quarta
categoria. A "Brastemp" espiritual que os teleevangelistas oferecem
vem do céu.

O acesso ao milagre se complica, porque todos mercadejam o mesmo
produto. Os critérios de escolha se reduzem a prazo de entrega,
conforto e garantia.

Opa, quase esqueci! As lojas, em conformidade com o Código do
Consumidor, são obrigadas a dar garantia, mas as igrejas evangélicas
não dão garantia alguma. O cliente nunca tem razão. Quando a filha
morrer de leucemia, o pai, além de enlutado, será responsabilizado
pela perda. Vai ter que escutar que a menina morreu porque ele "deu
brecha" para o diabo, não foi fiel ou não teve fé.
Mercadologicamente, Casas Bahia e Magazine Luiza estão bem à frente
das igrejas. Melhor assim, geladeira nova é bem mais útil do que a
ilusão do milagre.

Soli Deo Gloria.

IRMÃO ELIAS JOSÉ PONTES